DEBATE
Lei que regulamenta a produção nacional na tevê por assinatura levanta discussão e faz canais investirem na programação local
Depois de cinco anos de discussões no Congresso Nacional, a Lei 12.485 está prestes a entrar em vigor, no próximo dia 12. O que isso tem a ver com tevê? A resposta é simples: para quem não vem acompanhando o debate, a lei vai mudar o perfil do que você, telespectador, vem assistindo na programação. Em fase de consulta pública até o último sábado pela Agência Nacional do Cinema (Ancine) e ainda sem regulamentação, ela muda as regras do jogo para os canais de televisão por assinatura. A partir de 2013, eles terão de exibir uma hora e dez minutos de programação nacional por semana em seu horário nobre, num processo gradativo que, até 2014, chegará a três horas e 30 minutos — com pelo menos metade dessas horas compostas por atrações de produtoras independentes.
Outras determinações fazem parte da nova ordem, que será fiscalizada pela Ancine. Uma delas define que todos os pacotes de tevê por assinatura oferecidos ao público devem incluir um canal exclusivamente brasileiro para cada três canais de espaço qualificado (que apresentam, predominantemente, séries, documentários, filmes e animações). No entanto, canais de tevê aberta, esportivos e jornalísticos não entram neste esquema: sua grade continua a mesma, sem a obrigação de exibir obras nacionais, mas o limite máximo de publicidade será de 25%, como nas demais emissoras.
O texto da lei, datada de 11 de setembro de 2011, pode parecer confuso para quem não está acostumado com o linguajar técnico. Afinal, o que muda para quem está no sofá? Como os canais estão se preparando para atender à nova demanda? E as produtoras, já estão se mexendo?
Fernando Ramos, responsável pela Distribuição dos Canais Globosat diz que é necessário aguardar para ver como a lei vai atuar na rotina televisiva do público. “É preciso esperar para ver quais serão os impactos nos hábitos dos assinantes de tevê paga. A outra cota, im¬¬posta aos operadores, abrirá espaço para que os programadores optem por adaptarem os seus canais, ou não, para as cotas dos ‘canais brasileiros de espaço qualificado’. Caberá a cada programador fazer a análise dos prós e contras desta adaptação de suas grades, em alguns casos, certamente profundas”, analisa.
Canais como GNT e Multishow, diz Fernando, já cumprem ou estão muito próximos de cumprir os requisitos da lei. Portanto, suas grades não devem ser tão mexidas. No caso do Viva, ajustes serão feitos. Já o Canal Brasil, por ter mais de 12 horas diárias de conteúdo nacional, é considerado qualificado para cumprir a cota específica de canais brasileiros.
Pontos de vista
Durante o Rio Content Market, evento que discutiu a produção audiovisual no Brasil na semana passada, executivos de vários canais apresentaram seu ponto de vista. Vice-presidente do grupo Turner (que engloba, entre ou¬¬tros, TNT, Space, Cartoon Net¬¬work e Boomerang), Anthony Doyle se mostrou preocupado com os custos de produção e com as restrições ao conteúdo considerado qualificado para atender às novas exigências.
“Não podemos nos dar ao luxo de fazer nada que não se encaixe nas cotas e ainda temos dúvidas sobre o que é conteúdo qualificado, segundo a lei. Não se pode achar que a tevê por assinatura, sozinha, vá produzir, financiar e ainda amortizar esses custos”, explica Anthony.
No TNT, o investimento em séries nacionais de dramaturgia já está em andamento. No Space, no qual o foco é mais jovem, o reality show Amazing Race terá uma versão feita no Brasil, com competidores brasileiros. Além disso, o canal também pretende investir em seriados locais de ação, suspense e terror. No Cartoon Network, a produção verde-e-amarela já vem a todo vapor, mesmo antes das mudanças na lei, com as animações Tromba Trem e Gui & Estopa, além da Turma da Mônica.
De olho nos jovens, os canais Viacom — que incluem, no Brasil, o VH1, o Comedy Central e o Nickelodeon — já se antecipam às mu¬¬danças propostas pela lei. Segundo Roberto Martha, diretor de produção, o posicionamento é “menos pela lei, mais pelos canais e suas estratégias”. “Já começamos a produzir. Fizemos uma série de oito episódios de stand-up comedy, apresentados pelo Danilo Gentili, o Comedy Central Apresenta. O momento é de aguardar a regulação. Existem alguns pontos em aberto e só aí vamos saber como isso vai impactar no nosso negócio”, completa.
Diretor do Universal Channel, criado para ser o espaço para séries essencialmente americanas, Paulo Barata não procura cópias de atrações importadas. “Não queremos um House ou um Law & Order: SVU brasileiros. A primeira razão é grana. A comparação é injusta: um episódio de House custa de US$ 6 a 8 milhões. Vamos abordar esse processo com inventividade e mostrar atrações antagônicas às produções de Hollywood que exibimos”, explica.
No entanto, nem todos veem a proposta com bons olhos. Presidente da SKY, Luiz Eduardo Baptista da Rocha, o Bap, vem se posicionando abertamente contra a nova lei, em forma de cartas aos assinantes, declarações e vídeos. “Entendemos que há aspectos ilegais na lei. Se o Supremo Tribunal Federal entender que está correta, aceitamos. Mas não vamos nos calar. Existem outras formas de estimular a produção nacional, através de leis de fomento com caráter democrático.”
Fonte:Gazeta do Povo – Curitiba -Caderno G