Cerveja não é refresco — e seu consumo em larga escala pode ser tão nocivo quanto o de outras bebidas alcoólicas. A “loura”, porém, faz parte do seleto grupo de drogas lícitas cuja imagem é divulgada livremente no rádio e na TV. A legislação que regula a propaganda de bebidas (Lei nº 9.294/96) não alcança aquelas de teor alcoólico inferior a 13º GL, ou seja, as mais consumidas pela população, entre elas a cerveja e bebidas do tipo ice.
O maior avanço que tivemos no que se refere à prevenção de mortes no trânsito foi a aprovação da Lei Seca. Em sentido contrário a ela, estão as propagandas de bebidas alcoólicas, principalmente de cerveja, nas quais milhões de reais são investidos tendo os jovens como seu maior alvo.
Em pelo menos duas décadas tramitaram somente na Câmara dos Deputados mais de 230 projetos de lei que tratam do tema, apensados ao primeiro, que é de 1994, todos sob a forte resistência de setores ligados à indústria de bebidas. O fato é um só: o combate ao vício das drogas, que desagrega as famílias e corrói a sociedade, não se limita às substâncias químicas. As chamadas drogas lícitas também precisam de medidas restritivas e de uma legislação mais rigorosa.
É louvável, portanto, a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que proibiu o anúncio de bebidas com mais de 0,5º GL no período entre 6h e 21h. Essa publicidade traz mensagem de alto risco, pois induz ao consumo de álcool por parte de crianças e adolescentes. Não há justificativa plausível para incentivar um hábito que pode acarretar severas condições patológicas. Vale lembrar que o consumo de álcool interfere em aspectos básicos da vida, como trabalho, família e relações pessoais.
No Brasil, os jovens com mais de 15 anos bebem o equivalente a seis litros de álcool puro por ano. Não por coincidência, as mensagens publicitárias são explicitamente voltadas para essa faixa etária. As imagens exploram temas de forte apelo popular, como samba, carnaval, eventos esportivos e festivais de música. Sem contar as mensagens subliminares envolvendo sucesso profissional.
A influência negativa sobre jovens é evidente. O apelo ao consumo de bebidas tem efeitos nefastos. Além dos danos à saúde, a ingestão de álcool é uma das principais causas de acidentes ao volante. A cada ano, a violência no trânsito mata cerca de 50 mil pessoas no Brasil, principalmente jovens. O país registra uma taxa inaceitável de mortalidade no trânsito, de mais de 20 óbitos por 100 mil habitantes.
Esses índices justificam a tolerância zero imposta pela Lei Seca, bem como a restrição à propaganda de cerveja e outras bebidas alcoólicas. A alcoolemia zero é o único padrão aceitável de dirigibilidade sem riscos, de acordo com a Associação Médica Brasileira (AMB) e o Conselho Federal de Medicina.
Não há sensatez em permitir a livre veiculação de anúncios de cerveja. Afinal, estamos falando de preservar vidas.