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A internet é produto ou é serviço?

A internet confere poder de comunicação e acesso à informação a qualquer pessoa que se conecte, em qualquer lugar do mundo, independentemente de origem social ou situação econômica. Graças a ela, opositores de regimes fechados podem compartilhar suas ideias. Um vídeo de abuso policial pode ser propagado, eventualmente levando à punição dos responsáveis. A reclamação de um consumidor sobre a empresa que presta péssimo atendimento pode ser amplificada. Um morador de Jiparaná consegue assistir ao mesmo curso gratuito de física quântica que alguém de Londres.

A internet é mais que um meio de comunicação ou canal de entretenimento. É, acima de tudo, um serviço de utilidade pública. “Essencial, como a água”, declarou o cofundador da Apple Steve Wozniak.

A frase de Wozniak foi dita em um dia histórico para a rede, quando a FCC (Comissão Federal de Comunicação, na sigla em inglês), que nos EUA faz o papel da Anatel, aprovou a neutralidade da internet, trazendo alívio para ativistas e empresas de tecnologia e frustrando operadoras de telefonia e cabo e provedores de acesso.

Com a decisão, perdeu a visão da internet como produto e ganhou a da internet como serviço. É a mesma ótica promovida pelo Marco Civil aprovado no Brasil no ano passado.

Segundo o conceito da neutralidade, a velocidade da rede deve ser igual para qualquer tipo de conteúdo, seja do Facebook ou de um blog independente. Com ela em vigor, não pode haver discriminação dos dados.

Empresas não podem, por exemplo, piorar a qualidade do tráfego de um serviço para vender uma solução “expressa”, que é o que a megaoperadora Comcast fez com a Netflix nos Estados Unidos.

E no caso das “promoções” fechadas entre empresas provedoras de aplicativos e operadoras? Navegando pelo celular, você já deve ter se deparado com o aviso “Cobrança de dados padrão”, quando sai, por exemplo, do Facebook para entrar em algum link que alguém postou na sua timeline. Isso significa que a isenção ou desconto na cobrança de dados que você tinha quando usava o Facebook (resultado de parceria da rede social com operadoras) não está mais valendo.

Segundo algumas interpretações, esse tipo de preferência não fere a neutralidade. Entre os que acreditam nisso, está meu colega de espaço (e um dos pais da internet brasileira), Demi Getschko, que diz que “se o meu livre arbítrio em usar o que contratei estiver preservado, e se os ‘pacotes de dados’ não forem priorizados, não perco neutralidade com isso”.

Outro argumento a favor é aquele que diz que o acesso gratuito a certos aplicativos é do interesse do consumidor, ainda mais em países onde a situação econômica da maioria torna bem-vindo qualquer desconto.

Quem é contra, por outro lado, aponta que práticas assim sabotam a diversidade e o espírito horizontal da internet. Elas promovem uma situação onde, de um lado, empresas ricas bancam acesso para milhões, e do outro, uma massa de usuários visita os mesmos dois ou três sites.

O debate segue. O Marco Civil brasileiro está em processo de consulta pública até 31 de março. Contribua em participacao.mj.gov.br.

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