Em mais um vazamento de informação capaz de constranger a política externa americana em relação à América Latina e ao Brasil em particular, a revelação feita no domingo pelo “Fantástico” de que a Agência de Segurança Nacional americana (NSA, na sigla em inglês) também bisbilhotou telefonemas, e-mails e mensagens enviadas por meio de celular pela presidente Dilma Rousseff tornou grave uma situação já delicada.
A prova do rastreamento eletrônico da presidente consta de slides de uma apresentação secreta montada pela NSA acerca da vigilância sobre Dilma e o presidente do México, Enrique Peña Nieto. A fonte da notícia de mais esta ilegalidade do ponto de vista brasileiro continua a ser Edward Snowden, o ex-analista terceirizado da NSA, hoje asilado na Rússia, e que tem abastecido o jornalista britânico radicado no Rio Glenn Greenwald com esses documentos. Entre eles, os expostos pelo “Fantástico” e, no início de julho, pelo GLOBO, quando ficou provado que a NSA também espionava pessoas e empresas no Brasil.
A reportagem da TV Globo aumenta a octanagem da crise com os Estados Unidos, pois agora os alvos são diretamente a presidente da República e seu círculo de amigos e assessores, numa invasão da soberania nacional, além da privacidade de Dilma como cidadã.
A reportagem de julho já havia criado mal-estar nas relações com os Estados Unidos, para onde a presidente Dilma deverá ir em outubro, em visita de representante de Estado — isso se uma das retaliações brasileiras não vier a ser a suspensão da viagem.
Em entrevista conjunta, os ministros da Justiça e das Relações Exteriores, José Eduardo Cardozo e o recém-empossado Luiz Alberto Figueiredo enfatizaram, ontem, considerar “inadmissíveis” e “inaceitáveis” os fatos revelados na noite de domingo.
Além do pedido de explicações, “por escrito”, feito por Figueiredo, pela manhã, ao embaixador Thomas Shannon — diante das quais o governo decidirá o que fazer —, o chanceler reafirmou a intenção brasileira de levar para fóruns multilaterais o tema da megaespionagem eletrônica empreendida pelos Estados Unidos no mundo. Foi mencionado o Brics, grupo de países emergentes do qual o Brasil faz parte — Rússia, Índia, China e África do Sul.
Esta intenção havia sido anunciada em julho, depois da primeira reportagem. Ontem, o ministro Luiz Alberto Figueiredo se referiu à necessidade de uma “governança” mundial que preserve direitos de Estados, pessoas e empresas. O assunto é muito oportuno, diante dos avanços das tecnologias eletrônicas de espionagem. No plano interno, o Planalto deveria dar um passo nesta mesma direção e mobilizar sua base no Congresso a fim de aprovar o Marco Civil da Internet, pronto para ser votado na Câmara. A legislação traz dispositivos de proteção da privacidade. Seria uma forma de o Brasil dar o exemplo.
Fonte:O Globo -Opinião