SERTESP - Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo

Sindicato das Empresas de Rádio e
Televisão no Estado de São Paulo

Notícias SERTESP

Após agressões em protestos, jornalistas mudam visão sobre segurança pública

Desde junho, quando o país começou a presenciar a série de protestos em diversos estados, mais de 80 profissionais de imprensa foram agredidos física e moralmente, conforme levantamento realizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraij). Quem passou por isso não guarda boas lembranças e afirma que há pouca segurança para repórteres que cobrem momentos de conflitos.


Contratado da Globonews, Pedro Vedova teve sua história divulgada no mesmo dia em que policiais atiraram em sua testa: 20 de junho. O jornalista estava cobrindo os protestos no Rio de Janeiro quando a redação pediu para que ele pegasse a chegada dos manifestantes à prefeitura. “Mas a bateria da câmera acabou e não fazia sentido que eu estivesse lá sem equipamento. Corri para a base da redação e troquei. Quando voltei, a confusão já estava formada”.


Ao ver o conflito e auxiliado por dois seguranças da emissora, Vedova andou pela margem de um viaduto se escondendo atrás de palmeiras. “Quando cheguei até a última árvore, me senti vulnerável. Então, abaixei para apoiar a câmera. Não estava filmando, mas usei o zoom do equipamento para enxergar o que estava acontecendo a 100 metros de onde estava”. Naquele momento, o jornalista foi atingido no meio da testa.


“A gente sabe que parte da polícia é agressiva, mas jamais imaginaria que poderiam mirar na minha cabeça. As autoridades procuram controlar a confusão, mas não havia nada perto de mim que tivesse de ser controlado. Não dá para falar que o tiro foi acidental”. À época, Vedova não percebia que estar ali se tratava de ato corajoso. Depois de ficar afastado e passar por cirurgia, o cinegrafista comenta que ficou desapontado e frustrado com tudo que aconteceu.


Ex-repórter do Portal iBahia, de Salvador, Tiago Di Araújo passou por situação diferente do colega do Globonews. Era 22 de junho quando, ao fotografar as manifestações, três policiais o abordaram. “Pediram a minha identificação de profissional da imprensa e eu apresentei. Um dos policiais alegou que uma daquelas fotos poderia demitir um pai de família, me pedindo para apagá-las. Respondi que estava apenas fazendo o meu trabalho e eles me ameaçaram dizendo que eu iria perder todas as fotos”. E foi o que aconteceu, pelo menos num primeiro momento. Repreendido, Di Araújo foi obrigado a apagar as imagens, que recuperou por meio de um programa quando chegou à redação.


A atitude das autoridades foi ridícula, afirma o jornalista. “Só não fui agredido por ter me identificado com crachá e creio também por ser profissional da maior rede de comunicação do estado”.


Segurança


Di Araújo acredita que não há segurança suficiente para quem trabalha na rua e que, nestes casos, o profissional conta com a própria sorte e esperteza. “Mudei a minha confiança na segurança pública. E aumentou o medo em relação às atitudes policiais, que sempre optam pela violência física e verbal para impor certo tipo de respeito”. Ele afirma que não existe nenhum tipo de prevenção contra essas atitudes truculentas e que, depois do ocorrido, são geralmente acionados meios legais, que não resolvem em nada.


Vedova conta que, se fosse hoje, teria muito mais receio da polícia. “A questão é que o repórter precisa estar com a câmera apontada para o policial e para os manifestantes. O jornalista não tem o que fazer na manifestação se não isso. Ficaria mais atento à movimentação dos PM’s”. Ele acredita que situações como essas são específicas e que o profissional precisa ter postura ativa para levar informação completa e de qualidade às pessoas. “Ainda que haja dificuldades para cobrir por causa das autoridades ou manifestantes, temos que ir e fazer o nosso trabalho”.


Estratégias


Questionado sobre os cuidados para trabalhar durante coberturas de protestos, Vedova explica que não há muitas estratégias para se proteger. “Você vai aprendendo, mas eu já era repórter escaldado, fui criterioso e cuidadoso, mas acabou acontecendo”. O colaborador da Globonews acredita que se trata de fatalidade, algo que ninguém conseguiria prever.


Na Bahia, Di Araújo ressalta que ficou assustado com a situação e teve medo de registrar algumas fotos nos protestos que cobriu em seguida. “Fiquei bem abalado e com medo, por causa do histórico de violências policiais que ocorrem em nossa cidade. Eles gravaram a minha fisionomia e meu nome, e ainda me ameaçaram”.


Debate



A discussão sobre a violência contra profissionais de imprensa foi tema de hangout realizado pela Abraji na semana passada. O debate contou com a presença do presidente da entidade e editor do ‘RJTV’ (TV Globo), Marcelo Moreira, do diretor e repórter da Gazeta do Povo, Mauri König, e do coordenador dos cursos de jornalismo em situações de conflito armado e outras situações de violência realizados em São Paulo pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), João Paulo Charleaux.


Sobre as agressões que partem de manifestantes, Moreira disse que isso é reflexo de descontentamento com a mídia, que é vista como concentradora de informação. “Mas acontece que isso tem que ser discutido no campo das ideias e jamais o repórter deve ser vítima de violência por alguém que não concorde com o veículo de imprensa”.


König trouxe para o debate a visão de que a maioria da opinião pública acredita existir um grupo de jornalistas que iniciam seus trabalhos com o propósito de sacanear alguém e fazer mal. “Incomoda ver essa busca de usar a imprensa como bode expiatório de todos os males do Brasil. O repórter acaba sendo a ponta de lança da mídia tradicional e sofre na rua”. Ele acredita que as empresas de comunicação precisam ser responsáveis pela segurança de seus profissionais. “Grandes grupos têm assistência para o repórter que cobre conflitos, mas as pequenas não. Isso deveria ser geral. O jornalista não pode contar apenas com a cara e a coragem para fazer seu trabalho”.


Investir em treinamentos pode ser a saída para diminuir os casos de violência, explica Moreira. “O repórter percebe que uma matéria não compensa o risco que ele está correndo quando é treinado. Nenhuma imagem vale uma vida e não vale a pena que ele se arrisque por algo que será publicado em pouco espaço no veículo. Essa noção precisa ser repassada para os profissionais”.


Fonte: Comunique-se -Notícias

Pular para o conteúdo