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A arte do improviso

Tive um editor que, quando eu abria a boca para relatar as dificuldades para a execução de uma pauta, dizia: “Eu quero a solução”. Pois bem: no caso de quem cruza as longas estradas do Nordeste, muitas vezes a solução vem do improviso.


Para o repórter de impresso, como eu, saber lidar com o improviso é obrigação ainda maior. Repórter de jornal e de revista é tudo – apurador, produtor, redator… Sendo assim, longe da redação, em teoria, não se tem a quem recorrer. A dica: busque um colaborador. O apoio de um colega repórter que esteja na redação é muito útil, sobretudo em regiões longe da base e de equipamentos tecnológicos que facilitam a vida de um repórter. Não falo de um editor. Falo de um repórter com quem você tenha boa parceria, seja disponível, atento e rápido em retornos.


Daquele para quem você possa mandar uma mensagem telefônica se estiver perdido no alto de um morro onde não há sinal de telefone bom que permita uma ligação para uma fonte. Ou a quem você pode recorrer às 23h, pedindo que ache na internet uma alternativa de hotel próxima àquele que cobra R$ 12,00 a diária. Ou que encontre o promotor responsável pela comarca de tal município no meio de uma confusão eleitoral.


Ou alguém que possa desempenhar o papel de interlocutor em pautas mais complicadas. Lembro do dia em que fazia uma pauta em Água Preta (PE) sobre pistolagem. Estava no saguão de um hotel quando recebi uma ligação: “A senhora quer falar com fulano de tal?”, perguntava, referindo-se a uma fonte que eu procurava havia dois dias. “Se quiser, uma caminhonete branca vai lhe buscar às 20h aí, mas venha sem fotógrafo.” E aí? Vou ou não vou?, pensei. O fotógrafo, claro, não iria concordar, até porque ele perderia a foto. Era uma decisão pessoal. Disquei para um colega de redação.


Em outra situação, em Antonina do Norte (CE), o prefeito soube da reportagem, achou que ela seria prejudicial para a sua eleição e mandou um carro com quatro vpoliciais fazendo o convite para eu ir até lá. “Ok, estou terminando essa entrevista e vou em seguida”, eu disse. “Não, senhora. É agora”, retrucou o PM. Onde estava o prefeito, seis pessoas me esperavam. Clima tenso.


Fui convidada a sair da cidade. “Devo sair da cidade ou não?”, perguntei a um colega. Em Campo Alegre de Lourdes (BA), a questão foi mais simples, mas não menos preocupante: “Temos esse quarto para a senhora, o motorista e sua amiga fotógrafa. É uma de casal e uma de solteiro. Não se incomode se aparecerem bichos (o recepcionista falava de ratos). É R$ 12,00. Quer?”, perguntou.


O improviso e o coleguismo de outro repórter me salvaram, às 23h: “Rode mais 100 quilômetros ao norte. Tem um hotel num posto de gasolina”. Sei que também já salvei alguns improvisando ajuda.


Silvia Bessa é repórter especial do Diário de Pernambuco. Escreve sobre questões sociais e direitos humanos no Nordeste. silviabessape@gmail.com.


Fonte: Portal Imprensa -Últimas Notícias

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