Está em tramitação no Congresso americano um projeto de lei que pode sacudir a internet. Se aprovada, a lei, batizada como Combating Online Infringement and Counterfeits Act, daria poder ao governo dos Estados Unidos de mandar bloquear qualquer site ou domínio que hospede conteúdo violando direitos autorais.
E não é só essa a ameaça à privacidade na rede mundial. Segundo o jornal “The New York Times”, diretores do FBI, a polícia federal americana, já se reuniram com executivos da Google e do Facebook, entre outras empresas, para discutir uma proposta que torne mais fácil grampear internautas.
Os agentes querem reforçar uma lei de 1994 chamada Communications Assistance for Law Enforcement Act, para enquadrar mais as empresas do mundo on-line. Segundo essa lei, as operadoras de telecomunicações e os provedores de internet e banda larga devem estar sempre dispostas a cumprir ordens judiciais que exijam escutas telefônicas, e o FBI quer estendê-las também a gigantes como Google e Facebook, já que as pessoas cada vez mais usam suas ferramentas para se comunicar on-line.
Meio-termo seria a solução
● Para o advogado especializado em direitos autorais na era digital Renato Opice Blum, essa movimentação ilustra muito bem a difícil tarefa dos governos de legislar em cima da rapidez da tecnologia.
— O legislador precisa buscar o equilíbrio. Há sites que contêm coisas ilegais, mas também apresentam conteúdo legal — diz Blum. — O YouTube, por exemplo. Pode apresentar conteúdo que viole copyright, mas também tem muitos vídeos legítimos.
Por isso, é preciso que a lei dose seu veneno, ou sua vacina.
De acordo com o advogado brasileiro, o projeto americano tem como alvo os sites que flagrante e repetidamente se dedicam a violar o direito autoral.
— A lei brasileira prevê o fechamento e responsabilização civil e criminal de sites pela chamada “infração por contribuição”, mas é preciso separar o que é legal e ideal na mesma plataforma — explica Blum. — É preciso ter um meiotermo, que no Brasil é a ação inibitória, a qual permite retirar de um site o conteúdo que viole direitos, mas não fechar o site em si.
Nos EUA, entidades defensoras da liberdade de expressão já iniciaram uma grita contra o projeto de lei, apresentado pelo senador democrata Patrick Leahy, do estado de Vermont. A Electronic Frontier Foundation (EFF), por exemplo, chegou a compilar uma lista de sites que terão de sair da rede se o projeto for aprovado.
É o caso de páginas como o Rapidshare ou o Mediafire, que permitem uploads dos próprios usuários, ou blogs de MP3 e sites de remixes musicais.
Para a EFF, hoje, apesar da repressão, ainda há um equilíbrio entre “as punições devido ao copyright violado e à liberdade dos sites de inovar”. Com a nova lei (sem falar na iniciativa do FBI), os grupos de defesa das liberdades civis on-line acreditam que será instaurada de vez uma censura prévia na rede.
Brian Contos, diretor de Estratégia de Segurança Global e Gestão de Risco da McAfee, diz ao GLOBO que o projeto de lei americano, de fato, gera preocupações em relação à censura.
— Há sempre uma preocupação com o que é censurado agora e o que será censurado depois — diz Brian.
— Pense nos filmes. Censura-se uma cópia pirata hoje, daqui a pouco um blog com posts negativos sobre filmes amanhã e no dia depois de amanhã pode ser um site de um estúdio concorrente produzindo um filme parecido.
Professor sugere debater o assunto
● Contos explica que existem duas “listas negras” sendo debatidas no governo dos EUA. Uma vem do procurador- geral e outra da Suprema Corte.
— E quem garante que não haverá mais listas negras no futuro? Poderiam ser geradas por diversos grupos, até de fora do governo, e bloquear cada vez maiores listas de conteúdos — vaticina. — Os controles sugeridos para os servidores de nomes de domínio nos EUA e a inclusão em listas negras equivalem a botar curvas numa estrada para evitar que os motoristas corram.
Isso vai barrar tentativas básicas de acessar os sites, pelo menos no começo. Mas não será uma solução abrangente. Logo aparecerão formas de acessar os sites.
Ele acredita que qualquer lei sobre esse assunto só dará certo se houver discussões bem mais detalhadas envolvendo todos os setores.
— Me parece que há algo podre aí, e é preciso debater se realmente isso deveria ser feito e, em caso positivo, como deveria ser feito. O projeto de lei foi duramente atacado nos EUA pelo professor de Direito David Post, da Universidade de Temple. Ele escreveu que “se virar lei, o projeto alterará fundamentalmente a política americana sobre a expressão na internet, e criará um perigoso precedente com sérias consequências em potencial para a liberdade de expressão e a liberdade da internet global”.
Isso porque o projeto de Leahy prevê a ação do governo contra os domínios “mesmo que tal nome de domínio não esteja localizado nos EUA”.
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