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A música e a cultura das previsões


A quantidade de artigos e matérias jornalísticas sobre o futuro da indústria cultural é assombrosa. O número de teóricos, acadêmicos e especialistas na matéria não para de crescer e se multiplicar. Isso é até saudável. Espelha a reflexão coletiva acerca de uma importante questão: como seguir criando e produzindo entretenimento cultural em música, audiovisual, livros etc., garantindo que o conteúdo criado e produzido seja de qualidade e esteja ao alcance do público, e que, ao mesmo tempo, as atividades profissionais de criação e produção, duas coisas distintas, sejam justa e devidamente remuneradas?

O uso de softwares e aplicativos diversos em computadores e afins elevou a um potencial nunca antes imaginado as possibilidades de acesso e reprodução de bens culturais.

Essas possibilidades vieram a alterar significativamente, tanto a forma como esses bens são produzidos, como as relações entre artistas e produtores de entretenimento cultural com o público em geral. O fato é que ficou fácil demais acessar, ouvir, ver, escutar e baixar conteúdo artístico ou cultural independentemente de criadores e produtores serem remunerados na maioria dos casos.

Esta facilidade de acesso vai gerar alguns benefícios para a humanidade, mas é inegável que os setores que criam e produzem cultura de forma profissional e com finalidade comercial têm o enorme desafio de manter-se em atividade e, ao mesmo tempo em que convivem com a facilidade do acesso grátis (legal ou ilegal), desenvolver variados modelos de negócio que sejam suficientes para remunerar a cadeia produtiva do setor como um todo. E isto vem acontecendo nesses setores.

Apenas para ficar na área da música, boa parte das receitas hoje vem da área digital. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de 50% do que se fatura com música gravada vem das vendas e receitas da internet e dos celulares. Aqui no Brasil, devemos fechar 2011 com um percentual de receitas digitais no total do mercado de música passando dos 25%. Não obstante esses bons ventos digitais que também começam a soprar forte “no lado de baixo do Equador”, o mercado brasileiro de CDs e DVDs de música, após um longo período em queda, estabilizou-se nos últimos três anos, e vem apresentando crescimento, contrariando as previsões mais pessimistas.

E aqui eu volto aos teóricos, acadêmicos e especialistas que menciono no início. Alguns previam o fim do mercado de música gravada já na primeira metade da década passada.

Outros afirmam categoricamente que este ou aquele modelo de negócio é o futuro do mercado da música, sem ter nunca operado qualquer função nesse mesmo mercado, seja de criação ou produção. Raríssimos músicos ou profissionais do mercado musical arriscam, com propriedade, previsões semelhantes com tanto grau de certeza e afirmação quanto as que vêm do mundo acadêmico e de outras áreas profissionais estranhas ao setor da música. Acontece o mesmo em outros setores do entretenimento cultural, como no audiovisual e nos livros. Não que todas estas previsões sejam descartáveis, algumas certamente se confirmarão. Mas cravar o futuro da indústria cultural é tão incerto e duvidoso quanto qualquer outro exercício de futurologia.

Um pequeno detalhe não considerado pode mudar a história toda.

A propósito, o meio editorial deve estar em polvorosa. Paulo Coelho escreveu um artigo intitulado “Pirateiem meus livros”. Ao contrário do que este título possa sugerir à primeira vista, suspeito que Coelho tenha realmente querido dizer no tal artigo: pirateiem meus livros, porque vocês vão continuar a comprá-los de uma forma ou de outra. Que me perdoe o escritor, se me equivoco em minha ousadia. Mas, na essência de seu artigo e ao menos em minha opinião, a mensagem é esta.

Pelo menos Coelho não se aventurou em exercícios de futurologia como os teóricos, acadêmicos e especialistas de plantão. Afinal, em se tratando do “Mago”, não teria sido totalmente uma impropriedade arriscarse em previsões.

PAULO ROSA é presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD).

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