Os gastos do governo federal com publicidade são uma verdadeira caixa-preta. O Palácio do Planalto, por meio da Secretaria de Comunicação (Secom), se nega a detalhar as despesas da Presidência da República – o que inclui ministérios, secretarias agências federais e autarquias -, com as ações de marketing. Para este ano, segundo montante previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo dispõe de R$ 1,1 bilhão para investimentos em publicidade institucional, de utilidade pública e das empresas estatais.
Entretanto, mesmo sendo o maior anunciante em verbas líquidas do país, o governo federal ignora a legislação que estabelece transparência com esse tipo de despesa. O Planalto não cumpre a lei 12.232 de 2010, que determina a divulgação mensal dos gastos e os nomes dos veículos de comunicação beneficiados.
Essa lei, sancionada em abril do ano passado, pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estabelece que cada órgão do Executivo divulgue “em meios acessíveis, incluindo a internet, detalhes relativos à execução contratual com a publicação dos nomes dos fornecedores e veículos beneficiados com verbas de publicidade”.
Como o orçamento da União para 2011 prevê receitas de R$ 967,6 bilhões, significa que o Planalto reserva cerca de 1% de seu caixa para ações de publicidade, sem divulgar detalhes sobre a destinação do dinheiro público. As contas da Presidência da República são geridas, hoje, pelas agências publicitárias Matisse, Soho Square e Propeg.
Imbróglio. Em março deste ano, o jornal “Folha de S. Paulo” requereu uma relação de todas as empresas de mídia que veicularam propaganda estatal nos últimos dez anos. O jornal solicitou, junto à Secom, os nomes dos veículos e quanto cada um recebeu de verba publicitária do governo federal. Porém, a secretaria, que já não disponibiliza os resultados por meio da internet, e a despeito do que prevê lei 12.232, divulgou apenas dados genéricos, omitindo informações como os valores destinados a cada empresa e os nomes dos veículos de comunicação que receberam recursos federais.
Procurada por O TEMPO, a Secom, que no governo Dilma Rousseff está sob o comando da ministra Helena Chagas, informou apenas que “revelar os dados prejudicaria negociações de preços com veículos de comunicação” – mesmo argumento apresentado à “Folha”. Contudo, a Constituição Federal é clara ao garantir o direito de acesso a dados públicos. Além disso, a contratação de serviços por qualquer órgão público deve ocorrer via processo licitatório, a não ser em casos excepcionais, também previstos em lei.
Diante da negativa do governo, a “Folha de S. Paulo” ajuizou no Superior Tribunal de Justiça (STJ) uma ação contra a Secom para obter informações detalhadas sobre a publicidade. O processo impetrado pelo jornal foi distribuído no último dia 30 e está nas mãos do ministro Arnaldo Esteves de Lima, que responde pela primeira seção de direito público do STJ, mas ainda sem data para ser apreciado.
REPERCUSSÕES
Omissão recebe críticas da ANJ e de especialistas
A recusa do governo federal em divulgar detalhes sobre as despesas com publicidade é criticada por especialistas e entidades civis. O cientista político José Henrique e Silva afirma que a transparência vai além de uma obrigação legal e pontua que foi o uso de verbas de publicidade que provocaram o maior escândalo do governo Lula. “O mensalão foi abastecido com dinheiro de contratos de publicidade. O único mecanismo capaz de conter a corrupção é a transparência no uso da verba pública”, analisa o especialista.
Incisiva em suas críticas, a presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Judith Brito, destaca o dever do Estado em divulgar detalhes sobre o uso de recursos públicos. “Sociedades democráticas têm o dever se pautar por esses fundamentos de transparência”, afirma.
“O Estado está obrigado a fornecer aos cidadãos todas as informações de interesse público. Trata-se de um princípio democrático elementar, já que o Estado é decorrência da sociedade e por ela é custeado”, completa a dirigente. “Democracia não é apenas exercício do voto, calendário eleitoral, a posse dos eleitos, a alternância de poder ou o funcionamento do Legislativo. É também, e sobretudo, a transparência, o fim da opacidade”, destaca a presidente da ANJ.
“Informações públicas não são propriedade deste ou daquele governante. São direitos dos cidadãos e a eles devem ser prestadas, em um serviço institucional tipicamente democrático”, concluiu Judith Brito. (AA)
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